27 de jun. de 2014

Igreja fala em adotar atitude ‘não julgadora’ em relação a gays


Papa Francisco durante a Audiência Geral Semanal, na Praça de São Pedro, no Vaticano
Mesmo permanecendo contra a união entre pessoas do mesmo sexo, a Igreja Católica deve adotar uma atitude respeitosa e não julgadora em relação aos que vivem nessas uniões, e acolher filhos de casais gays. A abordagem está descrita em um documento que servirá como base para as discussões sobre os desafios pastorais da Igreja acerca da família católica.
O texto de 75 páginas é preparatório para a III Assembleia-Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos, reunião marcada para 5 a 19 de outubro. Foi elaborado como resposta a um questionário com 39 perguntas lançado em novembro do ano passado. As questões foram encaminhadas para mais de 5.000 bispos do mundo inteiro, que consultaram os católicos para apresentar quase uma pesquisa de opinião sobre a abordagem de temas ligados à família.

“Todas as Conferências Episcopais se expressaram contra uma 'redefinição' do matrimônio entre homem e mulher, através da introdução de uma legislação que permita a união entre duas pessoas do mesmo sexo”, diz o texto na parte dedicada ao casamento gay. “Existem amplos testemunhos dados pelas Conferências Episcopais acerca de um equilíbrio entre o ensinamento da Igreja sobre a família e uma atitude respeitosa e não julgadora em relação às pessoas que vivem nestas uniões. No seu conjunto, tem-se a impressão de que as reações extremas a tais uniões, tanto de condescendência como de intransigência, não facilitaram o desenvolvimento de uma pastoral eficaz, fiel ao magistério e misericordiosa para com as pessoas interessadas”.
As palavras ecoam a declaração dada pelo papa Francisco em seu retorno à Itália depois de comandar a Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro, em julho do ano passado. “Se uma pessoa é gay e procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, para julgá-la? O catecismo da Igreja católica explica isso muito bem. Diz que eles não devem ser discriminados, mas integrados à sociedade".
Em relação a filhos adotados de casais gays, o documento revela que as respostas recebidas “se pronunciam contra uma legislação que permita a adoção de filhos por parte de pessoas em união do mesmo sexo, porque veem em perigo o bem integral do filho, que tem direito a ter uma mãe e um pai”. “Todavia, caso as pessoas que vivem nestas uniões peçam o batismo para o filho, as respostas, quase unanimemente, ressaltam que o filho deve ser acolhido com as mesmas atenção, ternura e solicitude que recebem os outros filhos”.

Divórcio – O Instrumentum Laboris, como é oficialmente chamado, trata também de outro tema tabu da Igreja, o divórcio. O questionário indicou que muitos dos que voltaram a se casar no civil sofrem por não poderem mais receber os sacramentos. “O sofrimento causado pela não-recepção dos sacramentos está claramente presente nos batizados que estão conscientes da própria situação. Muitos sentem-se frustrados e marginalizados. Alguns perguntam-se por que motivo outros pecados são perdoados e este não”, destaca o texto, acrescentando que algumas respostas salientam a necessidade de haver instrumentos pastorais que permitam “abrir a possibilidade de exercer uma misericórdia, clemência e indulgência mais amplas em relação às novas uniões”.
Não há, contudo, qualquer indicação de mudança na abordagem pastoral. O texto expressa preocupação com a incompreensão da disciplina da Igreja, como se a negativa de acessos aos sacramentos fosse uma forma de punição. “Sem dúvida, nestes casos a Igreja não deve assumir a atitude de juiz que condena, mas a de uma mãe que acolhe sempre os seus filhos e cuida das suas feridas em vista da cura (...) Com compreensão e paciência, é importante explicar que a impossibilidade de aceder aos sacramentos não significa ser excluídos da vida cristã e da relação com Deus”.
O questionário, que chama a atenção pela sinceridade com que aborda temas espinhosos, não pressupõe nenhum gesto estrondoso de Francisco a partir de seus resultados. Servirá apenas para entender o que aproxima e o que afasta as famílias do catolicismo. Como um sínodo é convocado pelo papa, a quem cabe também a escolha do tema, tem-se ao final dele um conjunto de conclusões de grande força moral. Um sínodo, ressalve-se, tem poder meramente consultivo. Nenhuma decisão que surja desse tipo de encontro, portanto, é lei na Igreja
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